Pensão Alimentícia na Relação de Filiação

    A pensão alimentícia é toda prestação em pecúnia ou in natura, para a satisfação das necessidades básicas e essenciais aos que não tem condições de por si só manter-se, e devida por quem tem o dever legal de prover o sustento deste, assim chamados de alimentado e alimentante.


        Importante ressaltar que, no presente artigo iremos discorrer apenas sobre os alimentos devidos pelos genitores à sua prole.


      Nesse diapasão, embora seja incontroversa a obrigação de alimentos entre pais e filhos, essencial tecer alguns comentários a respeito deste tema, pois são inúmeras as dúvidas, especialmente quanto aos requisitos, prazo e os critérios para a fixação da quantia a ser paga.


        Nesse sentido, passemos a analisar tais indagações, a seguir:


        I-    Requisitos


       Inicialmente, consigna-se que a prestação alimentícia não é automática, decorrente única e exclusivamente do vínculo familiar, deve-se verificar alguns requisitos como a necessidade do alimentado e a possibilidade do alimentante, chamado pela doutrina e jurisprudência de binômio alimentar, conforme preceitua o art. 1.695 do Código Civil.


       Convém mencionar que existem doutrinadores e julgados mais recentes que defendem o trinômio alimentar, acrescentando, além da necessidade e possibilidade, a proporcionalidade.

   

       A necessidade, como a própria nomenclatura expõe, é a demonstração pelo alimentado de que efetivamente não detêm condições de prover o próprio sustento, ante ausência de bens ou a impossibilidade de laborar, fazendo jus a uma contribuição daquele que legalmente está incumbido em lhe auxiliar.


       Existem situações em que há presunção relativa (juris tantum) da necessidade, como por exemplo um menor totalmente incapaz. A presunção é relativa, visto que, embora um menor totalmente incapaz em regra não tenha condições de através de algum ofício auferir renda, existem raras exceções em que este efetivamente possui tal condição, por exemplo o caso de um artista mirim que tem vultuosos lucros decorrentes de publicidade, assim, não estaria demonstrada a necessidade.


       A possibilidade é outro requisito subjetivo, onde são analisadas as reais condições do alimentante, ou seja, se este efetivamente pode contribuir com a subsistência do alimentado, sem desfalcar-lhe o seu próprio sustento.


     Obviamente que há situações em que a necessidade se sobrepõe a possibilidade, pois, em que pese o alimentante não demonstrar recursos suficientes, é latente a necessidade do alimentado devendo aquele buscar todos os meios para suprir as necessidades deste, diante da responsabilidade por si assumida, isto é o que se extrai do Princípio da Paternidade Responsável descrito no art. 226, §7º da Constituição Federal.


     Desta maneira, os genitores estão obrigados a prestar alimentos a sua prole mesmo que, por exemplo, encontrando-se desempregados, já que ao gerar uma vida estavam assumindo as responsabilidades decorrentes deste encargo, não podendo o infante ser penalizado pelas desídias e irresponsabilidades de seus genitores.


     Por fim, destaca-se que a proporcionalidade é o critério utilizado para que o valor dos alimentos não fique aquém ou além do razoável, devendo ser fixado em patamares a atender as necessidades do alimentado e estando compatível com a possibilidade do alimentante, ou seja, o valor fixado não pode ser tão baixo de maneira a não suprir as necessidades básicas do alimentado, mas também não pode ser tão alto de forma a gerar um enriquecimento sem causa.


       II-  Prazo


    A legislação não impõe qualquer critério objetivo quanto a obrigação dos pais em pagar alimentos a seus filhos, o que ocorre, como dito anteriormente, é que os menores de 18 anos possuem presunção relativa de necessidade, porém, o fato de se completar a maioridade não extingue automaticamente esta obrigação.


     Assim, atingindo o alimentado 18 anos de idade, necessária a propositura de uma ação de exoneração de alimentos para que efetivamente seja extinta a obrigação, em sendo comprovado a ausência de necessidade.


      Entretanto, em que pese o alimentado após os 18 anos de idade possuir condições de obter um ofício a possibilitar-lhe prover o próprio sustento, acertadamente, a jurisprudência majoritária tem entendido que o dever de alimentos permanece até a conclusão do ensino superior. Ao contrário do que muitos acreditam também inexiste critério objetivo quanto a obrigação perdurar até os 24 anos, devendo ser observado as reais necessidades, sendo este entendimento apenas uma construção jurisprudencial, no qual, se tem defendido que o objetivo deste limite de idade é não incentivar o ócio e de maneira a não perpetuar a obrigação alimentar, já que tal prazo, em tese, é suficiente para a conclusão do curso superior.


    Outrossim, essa questão deve ser analisada pelo juiz no caso concreto com proporcionalidade e razoabilidade, existem situações de que o alimentado acaba se acomodando ante o auxílio prestado pelo alimentante, postergando o início de seus estudos no ensino superior, neste caso ao completar 24 anos, em regra, não poderia pleitear a manutenção dos alimentos até o término de seu curso.


     Diferentemente, por exemplo, da situação de um estudante de medicina que até passar no concorrido vestibular teve de estudar e trabalhar arduamente, não conseguindo passar na primeira prova. Logo, ao passar tardiamente e tratando-se de um curso extenso entendemos que neste caso, mesmo que a duração do curso se estenda após os 24 anos de idade, ainda sim este fará jus a uma contribuição alimentar de seus genitores.


       No caso acima o alimentado necessita de uma contribuição uma vez que ainda está estudando, não possuindo condições de trabalhar para prover o próprio sustento, ademais a demora na conclusão de seu curso não se deu por ócio ou desleixo, mas pelas dificuldades implícitas.


       Desta maneira, como é possível concluir não existem critérios estritamente objetivos, devendo ser analisado caso a caso, mas é possível observar que em regra o dever de alimentos se encerra aos 18 anos, ou até os 24 anos no caso de o alimentado estar cursando ensino superior.


    Comprovando esta subjetividade da relação alimentar, convém destacar o entendimento minoritário da jurisprudência de alguns tribunais de reconhecer como caracterizada a necessidade do alimentado quando este estiver cursando pós-graduação e efetivamente buscando inserção no mercado de trabalho. 


       Nesse sentido:


APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. MAIORIDADE. PROVA DA NECESSIDADE. PRORROGAÇÃO DA OBRIGAÇÃO. CONDIÇÃO DE ESTUDANTE. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA MANTIDA. A maioridade civil, por si só, não é suficiente para eximir o alimentante da obrigação de prestar alimentos, contudo, para que o encargo seja mantido, indispensável a prova da necessidade, por parte do alimentando, a qual deixa de ser presumida. Caso concreto em que a filha (alimentanda) mantêm a condição de estudante, cursando pós-graduação, buscando qualificação profissional para inserção no mercado de trabalho, necessitando do auxilio financeiro de seus genitores. PRELIMINAR REJEITADA. APELO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70063181770, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sandra Brisolara Medeiros, Julgado em 29/07/2015).


      Ressalte-se novamente que esta é uma tendência minoritária e com certeza possui algumas peculiaridades, muito embora analisando o cenário econômico nacional atual, possivelmente este entendimento possa ser alargado e utilizado por outros julgadores, já que cada vez mais o mercado de trabalho se mostra concorrido dificultando a inserção dos jovens, consequentemente caracterizando a necessidade.


        III-     Valor dos Alimentos


        Outra questão extremamente polêmica em relação aos alimentos é a fixação de seu quantum.


      Primeiramente, é importante mencionar que pensão alimentícia não compreende única e exclusivamente o dever de fornecer insumos alimentares, mas sim todas as necessidades básicas e essenciais do alimentado, englobando todos os direitos sociais descritos no art. 6º da Constituição Federal, dos quais destacamos: educação, saúde, alimentação, moradia, transporte, lazer e segurança.


           Portanto, a prestação alimentar deve ser capaz de manter itens mínimos que proporcionam a dignidade a qualquer ser humano.


       Ainda, como dito anteriormente, os alimentos podem ser prestados em pecúnia ou in natura, por exemplo, pagamento de plano de saúde, mensalidade escolar, vestuário, moradia, medicamentos, enfim qualquer elemento essencial prestado diretamente que não seja em dinheiro em espécie.


        Mas qual é o máximo ou o mínimo que o alimentante deve pagar? Como é fácil presumir pelo o que foi até aqui exposto, também inexiste critérios legais objetivos para a fixação da quantia a ser paga.


        Em regra o entendimento de diversos juristas, bem como da maioria das decisões judiciais é de que 30% dos rendimentos líquidos do alimentante em caso de emprego formal, e o mínimo de 1/3 (um terço) a ½ (metade) do salário mínimo em caso de desemprego, é um patamar justo, proporcional e razoável a atender aos requisitos já explicitados, necessidade/possibilidade.


            Todavia, existem situações que merecem algumas ponderações, as quais destacamos a seguir:


           a)   O fato de o alimentante possuir mais de um filho ou constituir nova família, não enseja necessariamente a redução de seu ônus alimentar.

Conforme já mencionado de acordo com o Princípio da Paternidade Responsável, se o alimentante já possui um filho e a consequente obrigação de prestar alimentos, mas ainda assim resolveu constituir nova família e gerar novos filhos estava consciente de suas responsabilidades, não podendo minorar sua obrigação anteriormente assumida sob a justificativa de sua própria irresponsabilidade.


        Entretanto, cabe no caso concreto analisar a situação de forma a não comprometer todo o rendimento do alimentante, criando um problema social.


         b)   No caso de o alimentante possuir uma condição financeira extremamente alta ou o alimentado tiver necessidades especiais que demandem custos excessivos, o valor dos alimentos deverão ser majorados ou minorados a depender da situação.


        Com efeito, no primeiro caso se o alimentante tiver um ganho extremamente significativo a fixação de porcentagem de seus rendimentos pode gerar um enriquecimento sem causa do alimentado.


         Logo, necessário a verificação de uma quantia de forma a manter um padrão compatível ao dos genitores, mas sem gerar enriquecimento ilícito.


       Já no segundo caso a situação é inversa, em se demonstrando que o alimentado possui necessidades especiais, por exemplo, alguma doença que demanda o uso de remédios demasiadamente caros, o alimentante também deverá sacrificar porcentagens mais altas de seu ganho a fim de auxiliar a prole. 


        Ressalte-se, ainda, que cabe aos dois genitores o encargo de custear as despesas de seus filhos, portanto, os custos devem ser partilhados de forma proporcional e equitativa dentro das possibilidades de cada um. Na prática o que ocorre é que o genitor que exerce a guarda de fato do filho supre diretamente as suas necessidades, enquanto o outro paga uma quantia pecuniária ou algumas despesas para cumprir com sua obrigação.


      Por fim, é bom relembrar que a paternidade é uma grande responsabilidade, mais que um dever legal, é um dever moral natural. Assim, independentemente do que a lei ou as decisões judiciais fixem, as partes devem ter o discernimento que sua prole necessita de uma contribuição, cabendo aos genitores fornecer tudo o que estiver a seu alcance.


Ivan Osni Pimenta Junior

Advogado

Sócio da Iglesias, Pimenta e Santos Advogados Associados